segunda-feira, 26 de maio de 2014

Vermelho

Claro,
a chance que se faz nas entrelinhas se perde no
rosto

Amarelo
No calor da reta que me entorta até chegar mais
perto

Cinza
os lados do quadrado refletindo seu disfarce bem em cima
de mim

Laranja.
Na velocidade do nosso círculo me afogo entre teus
problemas,

Azul
os olhares oblíquos se encontram com as chuvas
que vêm

Preto
e o vinho nas curvas incapazes de
seguir nos

Escuros
brinco de não ver as paralelas que nos
perpassam,

Branco
nossas linhas opostas que se cruzam e
se passam,

Verdes
os ângulos nos engolem
e se traçam de


Vermelho.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

HipoCrises

Do espaço que em mim me cabe, pouco é seu. Minha angústia ocupa todo o resto. Não tenho mais nós aos quais me agarrar, não tenho aonde chegar. Não tenho mais eu.

Mas isso, não te obrigo a entender. Sorrio de volta como se lá dentro fosse bonito, na certeza de que te convenço. Caio fundo na lama dos seus olhos esperando que no final eles não me revelem nada além de eu mesma. 

Se te abraço, é pra roubar teu calor, te fazendo acreditar em minhas meias palavras. Engulo hipocrisia direto da sua boca e cuspo pelo ouvido, bem na sua cara, enquanto você sorri. Então, te pego pela mão e levo pra casa, te dou um beijo na testa e te coloco pra dormir.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Guardei Todo Meu amor

Guardei meu amor e o deixei ali dentro, inchando, inchando, e saindo a cada toque que ela dava na minha mão, na angústia comedida da espera pelo que iria – sabia que sim – acontecer. 

Ela escolheu a música mais lenta e me chamou, rindo daquele jeito que não significava nada. Ali, com uma desculpa para estar cada vez mais perto do seu corpo, sentia aquele amor evaporando no suor enquanto rodávamos pelo salão. Esperava que a proximidade de nossos rostos transmitisse a ela todas as vontades que não podiam ser ditas. Estava tão imersa naquele seu balé desritmado que nem percebi o silêncio. 

Sua mão soltou minha cintura e meus olhos escreveram nos seus a história da transferência. Ela achou por melhor guardar e distribuir aos poucos, em cada abraço monitorado que me dava em meio àquelas testemunhas fatais de um crime ocular.

Ficava cada vez mais doído a soltar. Esperava que nossos peitos, tão perfeitamente encaixados, inventassem uma linguagem própria capaz de decretar fim à solidão que há tanto a incomodava. Enquanto não conseguiam, guardavam aquele amor que ia inchando, inchando, pronto para implodir na saliva da minha língua quando o silêncio não fosse mais regra. Enquanto isso, mantinha-me no direito de permanecer amada.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Tática de Guerra


Na noite quente de um fevereiro sub-tropical, ela apareceu. Sutil como sempre, mas não por isso menos perturbadora. Entrou pela porta dos fundos e se escondeu embaixo dos meus lençóis. A visão de seu corpo ali deitado, imóvel, não me assustou. Acostumei-me com suas aparições noturnas. Enquanto a observava, só imaginava o impacto que isto teria pela manhã, quando ela estiver ido.

Deitei-me ao seu lado e ela se multiplicou. Eram agora três, cercando minha angústia estampada. Falavam sobre assuntos que eu não compreendia enquanto a única coisa que me importava era a proximidade do seu corpo, a pouco mais de um palmo de distância. As luzes se apagaram em uma força do pensamento e a distorção sumiu. Estávamos agora só eu e ela, cobertas até a cabeça em uma tentativa fracassada de abafar os pensamentos. No silêncio inédito, me permiti pela primeira vez olhar em seus olhos sem medo que os meus denunciassem minhas intenções. Ela percorreu o caminho curto até minha boca e me deu um beijo rápido e caloroso, selando nosso pacto invisível. Tentei retribuir com um beijo silencioso em seu rosto, mas não a alcancei da primeira vez. Encorajada por sua aproximação espontânea, me lancei de novo em sua direção, agora acertando de leve sua bochecha. Ela não achou suficiente, não aceitava metades. Com seu poder de me persuadir com o olhar, me fez dizer o quanto a queria. Seu sorriso se abriu como se abre uma cortina pela manhã, deixando toda aquela luz penetrar em mim. Nunca vira seu sorriso bonito assim com nenhuma outra pessoa. Pensei, pelos dois minutos restantes, que poderia fazê-la feliz. Ela me abraçou e dormimos, com a certeza que poucos encontram nessa vida de estarmos exatamente onde deveríamos estar. Aí então abri os olhos e já era de manhã.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Leonismo

Quero escrever sem parar. Botar as folhas na máquina e escrever sem parar. Quero fumar todos os meus cigarros, passando o cheiro para os meus cabelos, a parede, o livro. Quero meu livro com cheiro de cigarro. E a capa manchada de cerveja. Quero ser lida no bar; no quarto sujo; durante o sexo. Antes e depois. Quero marcar a pele e a alma, quero arder os olhos, sangrar as orelhas. Quero estar nas bocas de batom barato, nos solados gastos. Quero que minhas páginas enrolem baseados. Quero incomodar soprando nas orelhas: “está tudo bem, o mundo é assim mesmo”. Quero ser marco de razão, mártir de uma revolução. Quero ouvir pessoas correndo e gritando. Quero sair em uma matéria de jornal e ser usada por mendigos em noites frias. Quero estar em xícaras de café, diluída na fumaça das conversas. Quero ser citada em músicas de hardcore, enquanto as pessoas batem uma nas outras consentidamente. Quero assistir ao fim do mundo, escrevendo sem parar. Botando folhas na máquina e escrevendo sem parar. Fumando todos os meus cigarros e escrevendo sem parar.
E aquele horror ao saber que chegara seu fim, foi a coisa mais profunda que já sentiu. Chorou, não pela morte, mas pela vida que não viveu.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Burn Burn Burn

Sobre o frio, não me interesso. Se não queimam como eu queimo encarando seus olhos enquanto desvio a atenção dos meus em direção ao chão ou qualquer coisa como a fumaça do meu cigarro ou a parede daquele quarto reluzente onde pela primeira vez vi seus olhos fechados, não me interesso. Do meu interesse finjo que não me interesso enquanto você se interessa por tudo menos por mim. Se interessante fosse não ter você e seguir seguindo sua alma com toque de superioridade e soberba e sofisticação que envolve e sufoca e leva todo o resto até sua boca ou o desejo dela, eu o faria. Se em meus sonhos não me perseguisse como mãe filha que mostra e desmostra e me mostra o quê quero sem falar ou fazer sorrindo pra mim e insinuando bem de perto que me quer como te quero assim bem quente e quentinha na sala no quarto no chão na escada na janela na cama no sofá na cadeira no chuveiro no fogão no tanque na mesa na cômoda no armário na pia enfim, não precisaria estar aqui escrevendo sem parar sem ponto ou inspiração como o contínuo que não é essa história sem relação cheia de interrogação exclamação mas pouca ação.